Sinopse do Filme - Reformulação
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Sinopse do Filme - Reformulação

O bairro do Arco do Cego é, como já referimos, um local de contrastes. É um local calmo e ao mesmo tempo agitado: jardins silenciosos e horas em que ouvem apenas os pássaros e alguns carros, pátios barulhentos à hora de intervalo do liceu quando se ouvem crianças a brincar. Sons contrastantes. Pessoas diferentes, cores diversas, espaços diferenciados. Idosos sozinhos e calados que deambulam, grupos de jovens animados que percorrem as ruas num passo rápido. A calma e a pressa. Quem não tem compromissos, e quem tem onde estar e horários a cumprir. Solidão e companhia. Convívio e abandono. A agitação da saída de manhã e do regresso ao fim da tarde, e a paz das restantes horas do dia. O mesmo se passa nas casas, prédios ou vivendas. Habitações cheias de gente e habitações desertas, janelas de onde se ouvem conversas e janelas permanentemente fechadas. Prédios onde vivem famílias e casas onde alguém mora sozinho e por vezes nem sai a rua. Contraste entre faixas etárias. Até as cores contrastam, cores vivas e vibrantes, e cores secas e desgastadas. Cores alegres e cores neutras. Fachadas renovadas, pintadas recentemente, arranjadas e novas; fachadas velhas, com a tinta estalada e marcas do tempo. As ruas demostram esta diferença, chegando até a haver ruas nas quais do lado direito se vê cor abundante e do lado esquerdo predominam tons pastel. Há ruas estreitas que se opõem a praças e jardins amplos. Espaços abertos de convívio e espaços fechados de deriva. Por outro lado, a tradição e a modernidade. A renovação e a história. É visível este contraste na sede da Caixa Geral de Depósitos, que limita o bairro: a antiga fábrica de cerâmica da qual resta uma chaminé e o grande edifício de traços modernos que hoje se ergue neste local. 
Este bairro é um sossego em demasia em certas horas, paira no ar um vento cheio de nada, uma passividade, um comodismo. Como se os habitantes se tivessem conformado com tal quietude que nem se esforçam por alterá-la, por dar vida ao local onde vivem. Habituaram-se a este bairro pacato, habituaram-se a uma rotina monótona, habituaram-se a um bairro onde absolutamente nada se passa mas que preserva a segurança aparente de que todos gostam. Neste sítio é como se o silêncio tivesse, ao longo do tempo, definido a a maneira de estar e de ser dos que o habitam. 
Este facto foi motivo de revolta da nossa parte. Como poderia um bairro, com uma história tão rica, uma localização tão privilegiada, um potencial imenso, ser apenas uma aldeia calada no meio da cidade de Lisboa? Foi-nos difícil conhecer o bairro pelo seu silêncio, pela falta de abertura ao mundo exterior, pelo medo do estranho. Pretendemos então, de certo modo, provocar. Já que não o conseguimos fazer naturalmente, tentámos forçar uma ação, uma reação por parte dos moradores. Poderá parecer uma mera brincadeira, mas tudo teve um propósito. Inserir uma personagem estranha no bairro e perceber como as pessoas reagiriam, ou não reagiriam. 

O nosso filme transmitirá, assim, por um lado os contrastes que captámos e as dualidades referidas que encontrámos no bairro ao longo de várias visitas e explorações. Por outro, retratará a pequena intervenção que fizemos de modo a acordar o bairro, a despertar algum tipo de questionamento, a provocar reações que há tanto têm estado paradas. Pessoas que se habituaram a um bem-estar e a uma passividade num local parado onde nenhuma novidade surge, vão deparar-se com um elemento estranho, exterior ao bairro, que parecerá uma mera piada mas será um meio para conhecermos melhor os indivíduos através da forma como reagem.

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